segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Eu, eu e tu, ele, nós e o Mundo

Moro só, tenho 48 anos, divorciei-me duas vezes, não tive filhos, não crio gatos ou cachorros e meu último namorado me deu um chute daqueles inesquecíveis.

Isso posto, posso dizer que ainda não sou feliz. Quando serei ou se ainda serei é a pergunta que me faço diariamente.

Acordo, trabalho, volto, leio, assisto à tv, vou ao cinema e a shows, curto algumas baladas, faço compras, viajo, retorno às segundas, chego aos domingos e tudo continua igual.

Igual ao que eu buscava aos 20 anos, com uma diferença não tão sutil: não sou mais jovem e o tempo corre, corre, e eu e meu corpo vão ficando pra trás ou já se adiantaram por demais na linha de chegada que espera todos nós?

Nesse último domingo, tentei refazer minha vida e procurar acertar doravante os enganos cometidos.

Primeiro, comecei ligando para uns amigos que há muito não via. Com toda a franqueza, não que eles sirvam pra nada, mas sempre se ouve e se fala com eles, os quais nos dão uma sensação, ainda que momentânea, de companhia.
Nos reunimos apenas eu, a Ana e o Célio. Conversamos, falamos de política, de novos músicos, de ótimas leituras e voltei pra casa e quando cá chego, quem eu reencontro? Eu, eu e tu, ele, nós e o mundo.

Não que eu cultivasse alguma ilusão de que, ao chegar em casa, a minha vida naqueles 100m² de pura solidão pudesse se desfazer em orgias de alegria, mas há uma torcida secreta no nosso âmago para que, de repente, como num lance de sorte – daqueles em que se vira milionário da noite para o dia ao riscar ridículos 6 números num pedaço de papel escrito mega-sena – eu pudesse transformar minha vida numa alegria perene.

Mas, como sabemos, ganhar num jogo é sorte e a nossa vida está para além da sorte: nossa vida é, acima de tudo ou mais que tudo, liberdade e nós não podemos com ela, porque fazemos dela a nossa prisão de cada dia que passa a se chamar solidão.

O fato é que, em casa novamente, aos 48 anos, não há amigos, aliás, não há gente que me tire desse não-saber-lidar-com-algo-que-não-me-ensinaram.

Do que me lembro, ninguém me ensinou a lidar comigo mesma, a lida era com o outro. Desde criança é a velha história: não brigue/ou/ cuidado com seu irmão (ou amigo ou inimigo ou primo ou vizinho); ou ame o próximo como a si mesmo. Ninguém diz pra você se amar como a ninguém mais no mundo ou pra brigar com todos menos consigo mesmo porque o que vai lhe restar ao final é somente você...e, então, ficamos tontos quando chegamos aos 48 anos e nos damos de cara com o mundo, estando sozinhos e tendo como companheiros apenas a palavra e a música (quando temos a sorte de alcançá-las em sua dimensão).

Ao contrário disso, diga-me: não era para qualquer pessoa sã estar feliz somente por poder, livremente, ler, ouvir música, sair e entrar quando quisesse, acordar aos finais de semana às 5 da tarde, dormir sozinha em uma cama enorme king size? Não, ninguém consegue se segurar com tanta liberdade; essa liberdade torna-se Solidão com S maiúsculo, daquelas que anseia pelo outro.

Ora bolas, eu bem que já desconfiava dessa fraqueza e impossibilidade humanas aos 16 anos, quando comentei, com uma sinceridade e espontaneidade contrangedora para o Luís, meu professor querido de História: - Professor, tenho pensado muito em você, acho que estou apaixonada...mas não gostaria de estar. – Não se preocupe, é natural esse tipo de paixão com sua idade, passa logo. Eu retruquei: - Não é isso, não é o estar apaixonada que me preocupa, é que eu não queria “precisar de você" pra me apaixonar.