sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

A Professora de História

- Você é professora de História?

- Não.

Depois da pergunta, reinou um silêncio entre nós, sentadas lado a lado naquela minúscula sala de espera, à espera do atendimento da Dra. Ana Maria, nossa psiquiatra.

De soslaio, olhei para ela, que aparentava mais tristeza que angústia, e eu, ao contrário, mais angustiada que triste, se é que há diferença entre o substantivo e o adjetivo nessas circunstâncias.

Para parecer solidária e educada, perguntei: - E você? É professora de História?

A última resposta que pensei foi a que ela deu: - Sou, dou aula no Ensino Médio.

- Ah, legal, disse, querendo ser simpática, mas sem entender nada.

Essa moça tá doida. Então ela é que era professora? E porque será que ela achou que eu fosse professora também? Olhei pra mim e pra ela, tentando fazer uma comparação, mas nada em nós nos tornava pessoas afins ou minimamente parecidas: ela era uma moça nova, mas cansada da vida ou de tudo; eu, embora com problemas de ansiedade, demonstrava alegria e faceirice e uma certa autosuficiência e prepotência, me achando superior a ela anos luz.
No mais, ela tinha uma pele amarelada, óculos de grau na cara, roupa chinfrim, enfim, parecia mesmo uma professorinha de quinta; eu, bronzeada, bem vestida, poderia ser identificada com qualquer dessas celebridadades instantâneas.

De repente, apareceu na porta do lado do corredor, um homem e chamou por ela:

- Lívia, vamos?

- Mas como, se eu ainda não fui atendida?

- Vamos, meu bem...você se esqueceu? Você foi atendida, não se lembra? Como que veio parar aqui novamente, sua fujona?

Ele encostou nela, deu-lhe um beijo, ela se levantou e seguiu aquele que parecia ser seu marido.

Ao chegar minha vez de ser atendida, comentei o caso com a doutora, me sentindo a neurótica mais certinha da vez, mas ela permaneceu em silêncio, com um sorriso de comiseração nos lábios, fazendo uma ou outra consideração a respeito do que eu comentava.

Ao sair, depois de debulhar todo o meu "rosário" de glórias e algumas queixas, dei um grito: a moça estava lá sentada novamente e sozinha.

Como a médica havia me acompanhado, abraçou-me pelo ombro, fez-me entrar novamente, sentar e tomar água com, imagino, algum desses “mata cavalos” e eu, acho, dormi.

Já acordada e ainda dopada e zonza, me vi na sala da casa de minha mãe, com meu marido ao meu redor, conversando comigo ou tentando conversar.

Minha cabeça rodava e quando tentei levantar, um livro caiu aos meus pés: era um livro de História do Brasil com uma pequena foto no canto à direita, na qual estava estampada a moça da ante-sala.

2 comentários:

  1. Puxa Tita, adorei essa! Muito boa, cheia de suspense e bem escrita. Prendeu a minha atenção. Tenho lido Edgar Allan Poe (o gato negro e outros contos), acho que você pode gostar. Ah, feliz ano novo! Beijo.

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  2. Oi Amarilis,
    Há um tempo atrás andei lendo Poe e me lembro que gostei muito, então quem sabe essa pequena estória não seja reminescências do que ficou da leitura dele...até vou ler novamente, valeu a dica.
    Por falar em dica, não sei se já leu Saul Bellow. Acabei de ler "Aventuras de Augie March" e indico, é magnífico.
    Beijo, Tita

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